Na semana do dia 8 de março, integrando o Mês Internacional das Mulheres, fiz duas enquetes nas minhas mídias sociais (que vocês podem conferir nos links aqui em cima).
Foi uma semana em que usei a câmera do celular para dar voz a uma série de apontamentos que, há anos, venho desenvolvendo sobre a vivência feminina. Reparos, experiências e reflexões que achei que era hora de dividir. A quantidade de respostas recebidas, de mulheres tão diferentes entre si, revela o quanto essas temáticas nos tocam e nos mobilizam. Agradeço a cada uma que compartilhou suas experiências ao longo desse processo por mensagens privadas e/ou comentários nas postagens. Foi muito bonito tecermos, juntas, essa rede de relatos.
Entre elementos comuns nas lutas que travamos todos os dias enquanto mulheres, encontrei variações de pontos de vista, outras paisagens, novos questionamentos. Diante dessa riqueza de narrativas e das possibilidades que elas constroem, divido aqui o resultado das enquetes em versão mais extensa.
Espero, por meio dessa dupla de artigos, ampliar o debate multiplataforma que o experimento proporcionou, além de permitir que tanto as mulheres que participaram das enquetes quanto o público que as acompanhou (ou venha a descobri-las) possam ter acesso a uma análise mais elaborada desse material.
A primeira parte dos resultados, relativa à primeira enquete, foi apresenta em artigo anterior. Você pode acessá-lo aqui. Continue, agora, com a parte dois, referente à segunda enquete.
Breves esclarecimentos: algumas respostas tiveram interferência minha ao interagir com elas. Aqui, aparecem em texto corrido, sem inserir o que comentei. O compilado a seguir é representativo das respostas recebidas, mas, por questões de objetividade, não traz cada uma das respostas compartilhadas.
Compilado de respostas à pergunta “O que ser mulher inspira você a fazer?”
“Tudo que quisermos! Somos capazes de tudo e ainda mais!”.
“Criar redes, uniões, nos fortalecermos juntas! Isso pra mim é uma coisa básica do Ser mulher: uma puxa a outra”.
“Acredito que ser mulher me faz querer lutar pelas causas femininas, e também me torna empática com outras bandeiras. Sei como é estar num lugar desprivilegiado”.
“Me inspira a ser exemplo para as meninas com quem convivo (sou mãe e professora)”.
“Ser mulher me inspira a lutar, falar, mudar, buscar ser a melhor versão de mim mesma todos os dias, me abrir, me expressar, buscar ajuda, plantar carinho, colher amor”.
“Parece que muita gente sabe quem foi um grande pintor, mas não sabe nomear uma grande pintora, ou quem foi um grande arquiteto e não quem foi uma grande arquiteta. Acho que isso me motiva a questionar isso, no sentido de buscar saber quem foram essas mulheres que se destacaram, mas que não alcançaram seu devido reconhecimento”.
“Ser mulher inspira a, quantas vezes for preciso, lutar pela vida. É chorar e sorrir ao mesmo tempo. Me inspira a levantar e seguir todos os dias. Me inspira a ser feliz!”.
“A botar a boca no trombone e falar de tudo aquilo que a gente enfrenta calada”.
“Ser mulher me inspira ao protagonismo. A querer contar histórias de protagonismo feminino, mas também escrever a minha própria história, respeitando meus tempos, minhas linhas e as páginas em branco, sempre lembrando tudo o que ainda posso lá preencher”.
“Servir de referência e apoio para mais mulheres”.
“Ter minha independência financeira, emocional, em todos os sentidos. Ser completa, por mim”.
“A sensibilidade mais presente em nós me inspira a criar. A coragem, a me jogar. A força, a persistir. Sigo firme lutando pelos meus princípios, pela gentileza (que não é só "coisa de mulherzinha"), pelos sonhos, pelo amor”.
“Discutir temas mais restritos ao "mundo dos homens", por exemplo, esportes, política, com a minha visão”.
“Ser mulher me ensina diariamente a perseverar. Correr atrás das minhas metas, independente do resultado não vir rapidamente ou a curto prazo. Persistir, mesmo que a vontade de desistir venha toda hora”.
“Passar batom. Acho lindo um batom bem passado e discreto”.
“Ser pioneira em diversas áreas ditas masculinas e inspirar outras mulheres”.
“Viver e lutar pelo meu espaço a cada dia”.
“Ser, me construir e me entender como mulher me inspira a nos admirar por todas as nossas múltiplas lutas, conquistas e potências. Me inspira a reconhecer nossa diversidade e, ao mesmo tempo, buscar união e apoio entre nós”.
“Viver e lutar pelo meu espaço a cada dia”.
“Construir redes de troca e aprendizado entre diferentes mulheres, uma cuida a outra”.
“Continuar tentando até alcançar meus objetivos”.
“Busco construir meu espaço, para que outras também tenham no futuro”.
“Pensar em um projeto de educação sexual para meninos e meninas de escolas periféricas na minha cidade. Debater sobre a possibilidade de não ter filhos, mostrar que PODE SER uma escolha. Tentar conscientizar outras mulheres sobre a maternidade compulsória”.
“Me inspira a estudar, me qualificar, ser melhor do que qualquer homem na minha área e mostrar que mulheres podem, sim, ocupar qualquer espaço”.
“A me expressar como eu quero e penso”.
“Conhecer o trabalho de outras mulheres, fazer parcerias com elas, inspirar o que fazem. Juntas vamos muito mais longe, é o que eu acho”.
“A ser eu mesma, com certeza”.
“Lutar!”.
“Me aceitar como sou e ser capaz de aceitar outras mulheres pelo que são também”.
“A celebrar mais mulheres”.
“Quebrar padrões e expectativas sobre nosso suposto lugar, sempre que possível”.
“Ser mulher me inspira a conquistar o meu espaço do meu jeito (gentil, cuidadoso)”.
“A seguir e seguir e seguir!”.
Respostas recorrentes
1º Conduzir a própria história, muitas vezes, com afeto e resiliência.
2º Persistir naquilo que deseja alcançar.
3º Inspirar outras mulheres e construir redes de apoio entre elas.
4º Ter destaque profissional, especialmente em áreas ditas masculinas.
Discussão dos resultados
Interessante perceber como a resiliência é um fator que se destaca nas respostas recebidas. Muitas vezes, aparece associada a um modo de concretizar objetivos que envolve tanto particularidades da mulher que responde (“do meu jeito”, “com a minha visão”) quanto características tomadas como majoritariamente femininas (delicadeza, cuidado, “plantar carinho”). “Sigo firme lutando pelos meus princípios, pela gentileza, que não é só "coisa de mulherzinha", pelos sonhos, pelo amor”, diz uma das respondentes. Podemos interpretar que, ao reivindicarem tais atributos nos momentos de agir pelo que desejam ou acreditam, essas mulheres busquem dar novos significados a eles. Retirá-los de interpretações pejorativas ou diminutas, validando outras formas de ação que não se relacionem à conduta tomada como masculina ou própria de uma esfera pública patriarcal (agressividade, dominância, rispidez).
Outro aspecto relevante das respostas é que muitas mulheres partem do princípio de que, provavelmente, o que buscam alcançar será difícil, terá algum obstáculo. Mas, talvez por estarem acostumadas a lidar com situações de agressão e precariedade no cotidiano, parecem encarar esses desafios como parte da jornada. O hábito de ter que furar bloqueios pode tornar a expectativa de se deparar com eles menos paralisante. Fazê-las “persistir, mesmo que a vontade de desistir venha toda hora”. A ideia de repetição desse ciclo fica implícita em várias respostas. “Continuar tentando” “quantas vezes for preciso”. “Seguir e seguir e seguir”.
O desejo de ter um desempenho notável na esfera do trabalho também marca presença. Podemos pensar até que ponto isso responde às avaliações severas e desiguais feitas sobre as atividades realizadas por mulheres. Se a cobrança sobre elas é maior, então sua atuação precisa ser melhor. O alto rendimento pode ser entendido como estratégia para contornarem desigualdades de gênero no ambiente profissional e, com isso, conseguirem se estabelecer apesar delas, mostrando que “mulheres podem, sim, ocupar qualquer espaço”.
Todavia, mais dois motivos foram apontados enquanto justificativa para a meta de se destacar na carreira: inspirar e abrir caminho para outras mulheres. O senso de consideração pelas demais (“uma puxa a outra”) e a vontade de construir redes de apoio entre elas indica o entendimento de que o espaço que conseguem conquistar repercute nas mulheres em geral, inclusive para que “outras também tenham [espaço] no futuro”.
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