O termo maternagem é utilizado em áreas como a Psicologia e a Enfermagem para designar o cuidado de mães ou outros cuidadores com crianças sob sua responsabilidade. Mas podemos expandir essa ideia para se relacionar às tarefas de educar e cuidar de quem se toma por filho/a, ou até aos cuidados com alguém, de certa forma, dependente da pessoa que o/a materna. Apesar de geralmente associada a crianças, a maternagem não se restringe a elas, podendo abranger adolescentes e mesmo adultos.
Em português, o sufixo latino agem expressa ação ou resultado de ação. Dessa forma, podemos entender a maternagem como processo contínuo, rotineiro, que se realiza por meio de atividades cotidianas. Em inglês, mothering também transmite noção de consistência e continuidade por meio do sufixo ing. O termo não existe em espanhol, mas, em trabalhos publicados no idioma, optei pela tradução maternaje, acionando o mesmo sufixo latino usado em português para uma língua também derivada do latim.
Diante disso, a maternagem não apenas pode ser entendida como a prática cotidiana da maternidade, mas também como sua própria performance. Dito de outro modo, a maternagem é um dos mais fortes elementos que constituem a rotina de atividades e atitudes que classificam uma mulher como mãe de seus filhos.
Todavia, a maternagem, por si só, não é suficiente para chamar alguém de mãe. Babás, avós, professoras, comadres, tias e madrinhas comumente desempenham tarefas relacionadas à maternagem das pessoas (em geral crianças, mas pode‑se incluir adolescentes, jovens adultos ou adultos com algum tipo de deficiência que demande maior amparo) sob seus cuidados. Isso não significa necessariamente que as enxerguem enquanto filhos/as, nem que sejam consideradas mães por aqueles/as que maternam. Do mesmo modo, uma mãe que deixe de maternar os filhos continuará sendo percebida enquanto mãe por boa parte da sociedade — uma vez que gerou ou adotou os referidos filhos —, ainda que não corresponda ao que se espera do comportamento materno.
Em diferentes culturas originárias, especialmente ameríndias e africanas, não existe vínculo de gênero entre a prática da maternagem e quem a realiza diariamente. No entanto, nas sociedades regidas pela cultura patriarcal, maternar é função feminina, para a qual as mulheres são preparadas desde cedo. Da boneca que chora quando a fralda muda de cor até estruturas sociais que depositam na mãe (ou na mulher mais próxima) a maior responsabilidade pelos filhos, o vínculo entre mulheres e maternagem é construído e sustentado. Não à toa a normatividade materna implica a expectativa social de que as mulheres sabem (desejam e gostam de) maternar.
Pesquisadoras, ativistas e interessadas nas questões maternas — entre elas, claro, muitas mães — defendem o argumento de que o cuidado e a educação dos filhos (ou de quem se toma por filho/a) não deve se restringir às mães ou apenas às mulheres. Compartilho desse posicionamento. Dividir tarefas, cobranças e desafios da maternagem é um dos passos para maior equidade entre os gêneros, além de enfraquecer premissas da maternidade compulsória.
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Maternagem e outras temáticas são melhor exploradas no livro “Ser mãe é f*d@!”: mulheres, (não) maternidade e mídias sociais.